Quando pensamos em vocação não temos dificuldade em associar esta palavra com alguma lembrança ou acontecimento. Facilmente, nos vem à memória a imagem dos sacerdotes e das religiosas que ofertam suas vidas em resposta a um chamado de Deus ou de alguém que procurou um teste vocacional para verificar qual a profissão mais adequada para sua área de interesses.
No entanto, vocação não se refere apenas àquelas pessoas que se dedicam a uma forma especial de consagração ou às predisposições que nos orientam numa determinada atividade profissional. A compreensão de vocação transcende quaisquer exclusividades e especificidades, referindo-se à completude da realidade humana, como já dizia São Paulo VI: “nos desígnios de Deus, cada homem é chamado a desenvolver-se, porque a vida de todo homem é vocação” (Populorum Progressio, 15).
De fato, falar sobre vocação não é tratar de um assunto alheio e distante de nossa condição humana. Sendo entendida como um chamamento, como sugere o verbo latino vocare (chamar) que está na sua etimologia, podemos dizer que a vocação é um chamado que perpassa a vida de cada homem. Aliás, a própria vida humana, como um chamado à existência, já é o primeiro sinal de uma vocação que nos é comunicada.
Não é demasiado lembrar que cada um de nós nasceu de um chamado à vida que teve sua origem na fecundidade do amor entre um homem e uma mulher. Esta primeira vocação, que se concretiza a partir do amor esponsal, reverbera a sacralidade da vida humana que é um dom supremo de Deus, seu único autor. Assim, ela é resposta a um chamado e por isso deve ser “respeitada e protegida de maneira absoluta” (CIC 2270).
Nesse sentido, em primeiro momento, a vocação pode ser caracterizada como dom, pois, cada pessoa humana é, em si mesma, resposta a uma vocação de Deus que lhe chamou, gratuitamente, a existir segundo sua imagem e semelhança. E, nesta esteira, podemos compreender que há na vocação também uma dimensão normativa.
Ora, se nos é dado viver segundo a vontade amorosa do nosso Deus, somos chamados a corresponder ao seu amor. O mesmo Deus que nos concede o dom da vida nos convida a significar esta vida no amor, nos convida a conduzi-la o mais próximo possível da vida divina, como nos indica o próprio Jesus: “deveis ser perfeitos como vosso Pai celeste é perfeito” (Mt 5,48).
O chamado à santidade é, portanto, uma vocação à comunhão com Deus, que se apresenta como uma norma de vida para o homem de fé. Viver na santidade corresponde à vocação universal a que todos, sem distinção, somos chamados a responder. É nossa meta em direção ao seguimento do Mestre Jesus.
Com efeito, da resposta a esta vocação à santidade concretiza-se a proposta da vida plena que Jesus veio nos apresentar nos Evangelhos, “Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10,10). São nas circunstâncias mais simples do cotidiano, na realidade em que estamos inseridos, que atingiremos a meta do apelo à santidade, como aponta o Papa Francisco: “todos somos chamados a ser santos, vivendo com amor e oferecendo o próprio testemunho nas ocupações de cada dia, onde cada um se encontra” (Gaudete et Exsultate, 14).
Sem sombra de dúvidas, o caminho de santidade que somos chamados a trilhar no seguimento ao Senhor nos impele à doação e nos proporciona uma resposta generosa a Ele. O empenho em orientar nossa vida a exemplo do viver de Cristo faz sobressair, com maior ênfase, que a vocação se realiza na escuta da Vontade de Deus e no serviço ao outro.
Sim, somos vocacionados a configurar nossa vida ao exemplo deixado pelo Senhor e, assim fazendo, somos igualmente vocacionados à missão de testemunhar o bom perfume de Cristo. A vocação que nos é comunicada não se esgota na vivência da santidade, uma vez que esta não se efetiva de forma solitária ou isolada. Ao contrário, a vocação é uma fonte transbordante que deságua sempre na missão, onde cada um torna-se discípulo-missionário para comunicar aos outros que “conhecer a Jesus foi o melhor presente que qualquer pessoa pode receber; tê-lo encontrado foi o melhor que ocorreu em nossas vidas, e fazê-lo conhecido com nossa palavra e obras é nossa alegria” (Documento de Aparecida, 29).
A vocação é, por excelência, um chamado à missão que cada homem e mulher, em seu estado de vida, pode partilhar a sua experiência de fé e conduz-se à realização.
Essa tríade de sentidos para vocação, entendida no dom da vida, na meta da santidade e na missão do testemunho, nos faz compreender que a vocação está intimamente ligada à integralidade da pessoa humana. Ser vocacionado significa ser chamado a tornar-se aquilo que Deus sonhou, significa fazer com que nossa vida seja uma vida vivida segundo os desígnios de Deus, e significa um transbordar incontrolável que nos impulsiona ao encontro do outro.
Fazendo coro às palavras do Papa Francisco, reforçamos que “a vocação nos orienta para oferecer o melhor de nós para a glória de Deus e para o bem dos outros” (Christus Vivit, 257). Se a vocação é um projeto de amor que orienta nosso viver e nos permite encontrar um caminho da felicidade já aqui nesta terra, vivamos nossa vocação com intensidade e alegria, sejamos generosos em nossa resposta ao chamado que o Senhor nos faz e, sobretudo, celebremos este grande dom que nos é dado. Vocação é dom de Deus, é meta de vida, é missão de todos nós.
Bruno Diego Garcia
Seminarista da Arquidiocese de Mariana